Primeiras chuvas
Querido Diário

Primeiras chuvas

Às vezes, quando chove, eu me lembro das primeiras chuvas que presenciei na minha vida, quando eu era criança. Eu lembro do cheiro, do verde das árvores, da cor das nuvens, tudo é muito vívido na minha memória, como se essas primeiras chuvas tivessem acontecido ontem e não há quase trinta anos.

É difícil ver o tempo passando e não ter controle nenhum da situação. É como se nós fossemos feitos apenas para andar por aí perdidos e com medo, assustados até com as marcas de expressão em nossos rostos, porque elas representam o começo do fim.

Existem dias mais fáceis, mas também existem muitos dias difíceis. Dias onde a vontade de voltar no tempo dói como uma dor física. O coração dói, o cérebro, os ossos. Tudo em meu corpo pede por algum tipo de alívio, mas remédio nenhum é capaz de tirar a dor do não pertencimento, da saudade de casa, do quanto era fácil ser criança.

Às vezes, eu queria sair do meu corpo e dos meus ossos, e sobrevoar as ruas da cidade, como se eu fosse um espírito livre, livre de todas as preocupações. Eu voaria alto, sentiria o vento no meu rosto, choraria de alegria ou de tristeza, quem sabe, mas no final da minha pequena viagem, eu voltaria para a minha casa de infância, e deitaria na minha cama de infância, e brincaria na minha rua de infância, sem medo do que viria depois, porque eu me sentiria segura no meu lar de infância.

Mas a gente cresce e todos esses medos nos perseguem como aves de rapina. Tudo é assustador, tudo dói, tudo machuca, até os nossos próprios pensamentos. Vivemos angustiados simplesmente porque crescemos e o mundo se apresentou para nós como ele, de fato, é, grande, sublime, mas cheio de tormentos eternos.

Talvez, um dia, esses sentimentos estranhos passem. Talvez, um dia, eu consiga encontrar paz na passagem do tempo. Que todos esses medos passem. Que todas essas angustias existenciais se dissipem com o tempo. Que eu me lembre, sempre, das noites quentes de verão, do vento nos meus cabelos e das pétalas de rosas brancas voando pelo quintal. Aquela Renata existe, ela só está escondida nas camadas de todas as Renatas que vieram depois.

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Foto de Styles Thien

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