A Ghost Story | Todas as coisas que cabem no tempo

A Ghost Story

Leia também: Trinta anos esta noite.

O tempo sempre foi um mistério para a humanidade. Afinal, por que existimos, se temos um tempo limitado para viver debaixo do sol? Por que todo o trabalho, desde a fecundação de um óvulo até o nascimento de uma vida, se todas as coisas passarão? Dia após dia, andamos de um lado para o outro, corremos atrás de sobrevivência, como se fôssemos importantes, como se todo o esforço valesse a pena, como se fôssemos viver para sempre. Mas nós não viveremos para sempre, nem chegaremos perto disso.

A Ghost Story é um filme marcante, estranho, complexo. É preciso muito mais que assistir para compreender o que ele quer dizer, porque a intenção do filme não é que você entenda, a intenção do filme é apenas reforçar o quanto nós conhecemos pouco sobre o tempo e sobre a morte, ele apenas reforça o quanto é frustrante viver dessa forma, ano após ano, sem saber o motivo de tudo isso.

O filme conta a história de C e M, protagonizados por Casey Affleck e Rooney Mara, e não existe nada de incomum na vida deles. Eles trabalham, eles conversam, eles dormem juntos. Tudo é muito comum, como na casa de qualquer casal, durante alguns minutos nós apenas assistimos o cotidiano. Mas, de repente, um acidente tira a vida de C e a partir desse momento nós entramos em uma atmosfera completamente diferente.

C volta para a casa onde viveu com a esposa, ele vira um fantasma, como aqueles fantasmas de desenho animado, com um lençol branco e dois buracos simbolizando os olhos. A partir desse ponto, ele se torna o personagem principal da história, um fantasma melancólico e solitário, assistindo sua esposa seguir em frente.

No início do filme, nós percebemos a frustração de M morando naquela casa, ela quer sair de lá, quer se mudar para um lugar melhor, mas C insiste em ficar, ele gosta da casa, existe uma história ali, ele não quer deixar essa história para trás. Com o passar dos dias, M conta para C que ela tem um costume peculiar desde criança, quando ela se muda, ela gosta de deixar um bilhete na casa onde morou.

A Ghost Story

– Eu escrevia bilhetes e os dobrava bem pequeno, então os escondia.

– O que eles diziam?

– Eram só coisas que eu gostaria de lembrar para o caso de que se eu quisesse voltar, haveria um pedaço de mim esperando.

Quando C morre, M não vê mas sentido em ficar naquela casa, ela já não gostava da casa, sem C, seria impossível continuar ali. Então, ela vai embora, deixando para trás o fantasma de C. Conforme a história avança, a gente percebe que C tem um propósito, ele não está preso na casa porque ele é apegado a casa, de fato, mas ele precisa fazer algo, ele precisa saber o que M deixou escrito no bilhete que deixou escondido na parede da casa quando foi embora.

C é uma fantasma em busca de algo que o faça lembrar que ele existiu, que ele viveu durante um tempo na Terra. A busca pelo bilhete de M não é apenas curiosidade, o bilhete é um pedaço de M, um pedaço que ele vai reencontrar quando encontrar o bilhete.

Eu nunca me senti tão triste assistindo um filme, eu fiquei dias pensando naquele fantasma solitário, sobrevivendo apenas de lembranças, em busca de algo que o fizesse seguir em frente. Nós vivemos dessa forma, nos apegamos a flashes de coisas que um dia existiram, porque nós precisamos sentir que todas essas coisas foram reais, que não foi tudo em vão.

Nós não somos infinitos, mas o tempo é, e nele cabe todas as coisas que nós gostaríamos de levar conosco. Momentos, sorrisos, pessoas, lágrimas, tudo ficará marcado no tempo. Seremos esquecidos, nos tornaremos o fantasma de alguém, mas nós estivemos aqui, nós fizemos parte de uma partícula mínima do Universo. Se, um dia, o mundo acabar, se um asteroide atingir a Terra e dizimar a população, nos misturaremos com as estrelas queimando vivas no céu, viajaremos anos luz, pela escuridão cheia de pontos de luz e seremos livres dessa casca que chamamos de corpo.

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